Uma pessoa não vacinada contra a covid-19 não coloca em risco apenas a própria saúde, mas também a de todos, já que se torna foco para o surgimento de variantes. A mutação do coronavírus ocorre em infectados e a vacina reduz o risco de infecção, conforme explica o infectologista Renato Grinbaum, consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia).
“A vacina faz com que o corpo tenha defesas contra o vírus. Uma pessoa vacinada até pode apresentar sintomas, porque o vírus é rápido, mas as defesas que já possui serão ativadas e dificilmente possibilitará que o vírus evolua de forma grave. Assim, uma pessoa vacinada, na maioria das vezes, não terá grande replicação viral, dificultando o surgimento de variantes, diferentemente de quem não recebeu o imunizante e não possui proteção contra o vírus”, afirma.
Grinbaum ressalta que o surgimento de novas variantes se dá durante o período de infecção pelo vírus, mas que a pessoa que serviu de desenvolvimeno para essa mutação provavelmente não experimentará suas consequências, apenas as que se infectarem na sequência.
“Se uma pessoa infectada desenvolver uma cepa mutante, provavelmente não sofrerá as consequências desta variante, mas poderá transmiti-la para outras pessoas”, aponta.
A infectologista Andyane Tetila, presidente da SIMS (Sociedade de Infectologia de Mato Grosso do Sul), explica que as mutações de um vírus são um evento natural e esperado dentro do seu processo evolutivo. A maioria não provoca grande impacto na doença, mas podem surgir cepas mais transmissíveis e letais.
“Quando um vírus está circulando amplamente entre a população, a probabilidade de sofrer mutação aumenta. Quanto mais oportunidades um vírus tem de se espalhar, mais ele se replica", afirma.
"A maioria das mutações virais têm pouco ou nenhum impacto na capacidade do vírus de causar infecções e doenças. Mas, dependendo de onde as alterações estão localizadas no vírus, podem afetar as suas propriedades, como a transmissão ou gravidade", acrescenta.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determinou o recolhimento de alguns lotes da vacina CoronaVac, contra a covid-19, que foram interditados após constatação de que “dados apresentados pelo laboratório não comprovam a realização do envase da vacina em condições satisfatórias de boas práticas de fabricação”.
A determinação foi anunciada hoje (22) por meio da Resolução (RE) 3.609, que determinou o recolhimento dos lotes da CoronaVac que já haviam sido interditados de forma cautelar pela Resolução (RE) 3.425, de 4 de setembro de 2021.
No dia 3 de setembro, a agência foi comunicada pelo Instituto Butantan que o parceiro na fabricação vacina CoronaVac, o laboratório Sinovac, havia enviado para o Brasil 25 lotes na apresentação frasco-ampola (monodose e duas doses), totalizando 12.113.934 doses, que foram envasados em instalações não inspecionadas pela Anvisa.
Diante da situação, e “considerando as características do produto e a complexidade do processo fabril, já que vacinas são produtos estéreis (injetáveis) que devem ser fabricados em rigorosas condições assépticas”, a Anvisa adotou medida cautelar com o objetivo de mitigar um potencial risco sanitário.
Em nota divulgada há pouco, a agência informa que, desde a interdição cautelar, avaliou todos os documentos encaminhados pelo Instituto Butantan, “dentre os quais os emitidos pela autoridade sanitária chinesa”.
“Os documentos encaminhados consistiram em formulários de não conformidades que reforçaram as preocupações quanto às práticas assépticas e à rastreabilidade dos lotes”, detalha a nota.
A Anvisa acrescenta que também fez a análise das documentações referentes à análise de risco e à inspeção remota realizadas pelo Instituto Butantan, “e concluiu que permaneciam as incertezas sobre o novo local de fabricação, diante das não conformidades apontadas”.
Os lotes interditados “não correspondem ao produto aprovado pela Anvisa nos termos da Autorização Temporária de Uso Emergencial (AUE) da vacina CoronaVac”, uma vez que foram fabricados em local não aprovado pela agência e, conforme informado pelo próprio Instituto Butantan, “nunca inspecionado por autoridade com sistema regulatório equivalente ao da Anvisa”.
“Portanto, considerando que os dados apresentados sobre a planta da empresa Sinovac localizada no número 41 Yongda Road, Pequim, não comprovam a realização do envase da vacina CoronaVac em condições satisfatórias de boas práticas de fabricação, a Anvisa concluiu, com base no princípio da precaução, que não seria possível realizar a desinterdição dos lotes”, completa a nota.
A Anvisa concluiu também que a realização de inspeção presencial na China não afastaria a motivação que levou à interdição cautelar dos lotes, por se tratar de produtos irregulares, uma vez que não correspondem ao produto aprovado pela Anvisa, por terem sido envasados em local não aprovado pela agência.
Diante a situação, ficará a cargo dos importadores adotar os procedimentos necessários para o recolhimento das vacinas restantes de todos os lotes que foram interditados.
A agência enfatiza que “a vacina CoronaVac permanece autorizada no país e possui relação benefício-risco favorável ao seu uso no país”, desde que produzida nos termos aprovados pela autoridade sanitária.
Confira os lotes impactados
Segundo a Anvisa, 12.113.934 doses de lotes cujo recolhimento foi determinado pela Anvisa já foram distribuídos. São eles: IB: 202107101H, 202107102H, 202107103H, 202107104H, 202108108H, 202108109H, 202108110H, 202108111H, 202108112H, 202108113H, 202108114H, 202108115H, 202108116H e L202106038.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) informou em seu relatório semanal sobre a covid-19, divulgado nesta terça-feira (21), que a variante Delta do coronavírus já é predominante "na maioria das regiões do mundo".
A entidade salienta ainda que a cepa, identificada na Índia em outubro de 2020, representou 90% de todas as sequências genéticas submetidas ao banco de dados global GISAID com data de coleta de amostra entre 15 de junho e 15 de setembro.
No Brasil, dados da Rede Genômica Fiocruz mostram que a Delta também já é prevalente no Brasil, com 74,5% de todos os genomas sequenciados no mês de agosto. No mês anterior, a prevalência era de 25,4%.
A Delta é classificada pela OMS como uma VOC (variante de preocupação), especialmente por ser muito mais transmissível do que as outras cepas, como Alfa, Beta e Gama.
A variante também tem uma capacidade maior de reduzir a atividade de anticorpos neutralizantes conferidos pela própria covid-19 e pela vacinação.
Todavia, a imunização completa continua a ser a melhor forma de evitar quadros graves da doença, independentemente da variante.
Um dos vírus mais frequentemente encontrados no organismo humano é o TTV (torquetenovírus), comum também em macacos e animais domésticos. Sua presença até hoje não foi associada a nenhuma doença. Mas, quando ele começa a se replicar demais, é sinal de que algo vai mal no sistema imune.
Essa correlação entre carga de TTV elevada e imunossupressão já tem sido usada na medicina em alguns contextos, por exemplo, para monitorar pacientes transplantados e que precisam tomar remédios para evitar a rejeição do órgão. Agora, um novo estudo da Universidade de São Paulo (USP) sugere que a concentração de TTV no organismo de um infectado pelo SARS-CoV-2 pode servir como marcador de intensidade e de recuperação da covid-19. Os resultados foram divulgados na revista PLOS ONE.
“Analisamos amostras de 91 pacientes com infecção pelo SARS-CoV-2 confirmada por RT-PCR e de outras 126 pessoas com síndrome gripal que testaram negativo. Observamos que os títulos de TTV aumentaram nos infectados pelo novo coronavírus – quanto mais altos, mais tempo eles permaneceram doentes – e que a queda da carga viral foi acompanhada de resolução dos sintomas. Já nos indivíduos não infectados, a concentração de TTV manteve-se estável durante todo o período sintomático”, conta Maria Cássia Mendes-Correa, professora da Faculdade de Medicina (FM-USP) e uma das autoras do artigo.
Mendes-Correa coordena o Laboratório de Investigação Médica em Virologia (LIM52) do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo (IMT-USP), onde há alguns anos o TTV tem sido analisado em contextos variados. A linha de pesquisa é liderada por Tania Regina Tozetto-Mendoza, bióloga e coautora do trabalho recém-publicado.
“Temos estudado o TTV como um potencial biomarcador de certos desfechos clínicos, medido em diferentes fluidos biológicos”, conta Tozetto-Mendoza.
O atual estudo foi desenvolvido no âmbito do Programa Corona São Caetano, uma plataforma on-line criada para organizar o monitoramento remoto de moradores com sintomas de covid-19 por equipes de saúde e a coleta domiciliar de amostras para diagnóstico. A iniciativa envolve a Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), a prefeitura local, a startup MRS - Modular Research System e o IMT-USP (leia mais em: agencia.fapesp.br/33604).
Com amostras coletadas de pacientes atendidos por esse programa, os pesquisadores do IMT-USP têm investigado – com apoio da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) – como varia a eliminação do SARS-CoV-2 ao longo do tempo em diversos fluidos corporais, entre eles sangue, urina e saliva.
“Tivemos então a ideia de analisar nessas amostras a carga de TTV para ver se havia alguma relação com o quadro clínico da covid-19. E os resultados mostram que o TTV, de fato, pode ser um marcador de evolução e resolução da doença. Quanto mais sintomático o paciente estava, maior era a carga de TTV na amostra”, conta Mendes-Correa.
A pesquisadora conta que todos os pacientes incluídos na pesquisa tiveram quadros leves ou moderados de covid-19. A análise da carga viral – tanto do TTV quanto do SARS-CoV-2 – foi feita usando amostras de saliva. Por meio de um questionário aplicado aos participantes, foi possível constatar que nenhum deles era portador de doenças que causam imunossupressão, como câncer ou Aids.
“Acredita-se que a covid-19, ao provocar um desequilíbrio imunológico, pode levar a certo grau de imunodepressão. E isso favorece a replicação do TTV”, explica Mendes-Correa.
Apoio ao diagnóstico
Segundo a pesquisadora, não há uma aplicação clínica direta para a descoberta. Mas ela pode, no futuro, contribuir para aprimorar o diagnóstico e o prognóstico da covid-19.
“Hoje todos buscamos meios para obter um diagnóstico rápido e preciso. Uma das possibilidades é desenvolver um kit capaz de dosar vários biomarcadores da doença ao mesmo tempo e depois avaliar os resultados com o auxílio de algoritmos. A medida da carga de TTV é um dos vários testes que podem ser incorporados nesses algoritmos para subsidiar o diagnóstico. É nessa direção que a medicina está caminhando”, diz.